Uma das frases chave do
Movimento Spiridon diz: a corrida é a principal das coisas secundárias.
O texto que se segue, da autoria
de Egas Branco, aparentemente nada tem a ver com a corrida. Mas grande parte do que somos hoje deve-se à formação e educação a que fomos submetidos desde a mais
tenra idade. Muito provavelmente o Egas não seria o que é hoje se os caminhos
percorridos na infância não fossem aqueles e muito provavelmente este blogue,
que é um projecto e um trabalho a dois, pese embora apoiado e com a colaboração
de muitos, não existiria ou pelo menos não o conheceríamos da forma que é.
Este blogue muito direccionado
para o colectivo não deixa de fazer uns desvios para sentires de alma mais
pessoais e o texto que se segue é um desses, belos, desvios.
No início deste 42º
Ano desde o 25 de Abril e da vitória sobre
fascismo, peço desculpa aos amigos se publico algo de muito pessoal, a
que aliás sou em geral avesso.
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Mas em Abril-Maio, sem
querermos, chega-nos algum sentimentalismo,
que também tem a ver com idade, que no entanto nunca nos impedirá de olhar para o Futuro - dos Amigos, do nosso
País e do Mundo. E podem crer que cada vez que, nalguma parte deste nosso
Mundo, por mais remota que seja, homens
tomam o futuro nas mãos derrotando a exploração e a opressão, sinto uma enorme
alegria.
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Devo a estes dois
seres (Mãe - 15-Mai-1907 - 27-Mai-1986,
Pai - 9-Nov-1911 -24-Jun-1987), exemplos que nunca esqueci e que me ajudaram:
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Ela, por se ter
recusado a assinar uma declaração de fidelidade às ideologias fascista e
católica, a que obrigavam os professores primários de então, foi desterrada
para a mais recôndita das aldeias beirãs, onde ainda hoje (de novo hoje, com o
regresso dessas ideologias a muitos aspectos
da vida no nosso País) é difícil chegar.
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No casamento,
desobedeceram a todos os preconceitos vigentes, e partiram em lua-de-mel para
quase 50 anos de vida em comum e deixaram, ambos, representantes na cerimónia
oficial!
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O primeiro dos quatro
filhos, apesar de todas as pressões oficiais e da família, não foi baptizado,
num acto de Liberdade de que lhes sou para sempre grato. Poderia vir a faze-lo
mais tarde, se quisesse, mas com plena responsabilidade do meu acto. E devo
lembrar que quando fui para a escola eles me recomendaram que não dissesse que o
não era porque senão viria a sofrer por isso (isto para os saudosistas desse
tempo de exploração, miséria e perseguição, que pretendem esconder o que
realmente se passava nesses tempos lugubres e terríveis) e nunca entendi essa
omissão ou negação como uma mentira, mas como uma defesa contra a repressão.
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Ela era profundamente cristã,
católica, ele ateu. Foram-no sempre até ao fim da vida e isso não impediu que
fossem acima de tudo humanistas, anti-fascistas e sempre do lado dos humilhados
e ofendidos desta sociedade em que vivemos, embora há 41 anos justamente e
durante algum tempo chegássemos a pensar (e eles também) que iria ser possível,
através de mudanças muito concretas (em que as principais foram feitas!), construir
uma sociedade diferente, mais igual, mais livre, mais fraterna, a caminho de um
ideal de justiça, a que alguns dos amigos podem não chamar nada mas que eu
chamo Socialismo.
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Devo-lhes estes e
outros exemplos a que tenho tentado ser fiel. Errei algumas vezes, como muita
gente, principalmente por ter avaliado mal os humanos mais que as causas, mas
nunca reneguei os princípios.
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